Tenho saudades da bola de berlim. Foi durante anos a fio a minha fantasia de criança, gulosa e inconsciente. Só de imaginar aquela lava de recheio, apertada numa massa macia, polvilhada por um pó branco, fico em delírio e movo montanhas para sentir essa esfera de prazer. Os seus efeitos são tão mágicos quando a devoramos, só apetece quebrar as boas regras da educação e lamber os dedos, abrir a boca ao máximo e rasgar violentamente os ligamentos de massa envolvidos em creme, atribuir à nossa língua a função de sonda para detectar o que não se pode desperdiçar e ficou alojado em nossos lábios, resistentes a tanto sabor. Quentes e boas ou quentes e fofas são dois dos pregões que servem para homenagear a Deusa da doçaria tradicional. Em tempos, foi o ícone dos bolos de pastelaria e a preferência da pequenada, que saía disparada da escola para lambuzar os sentidos.
Ainda hoje salivo quando avisto uma bola de berlim e custo a resistir-lhe.
Infelizmente, a bola de berlim não abunda mais nas vitrines, nem é destaque na propaganda à doçaria diversa. Em vias de extinção, este doce, outrora típico e apreciado por muitos, tende a desaparecer para grande tristeza minha. Algo que fez parte do meu passado bom e do qual nunca pensei ter que me despedir. Ressuscitar a hegemonia da bola de berlim é uma forma de manter a ligação com esse passado, que me proporcionou momentos de felicidade, que não se repetem mais. Eu sou da geração da bola de berlim. Essa fofa e tosca concentração de açúcar pode não caber no esterótipo das tartes, nem das componentes principais do chá das cinco, mas representou um manifesto de amor nos lanches caseiros em família.
Acabar com a bola de berlim é também destratar, sem piedade, a história de uma época recheada de boas sensações, que importa conservar.
Saia-se uma bola de berlim caprichada sem poupar no creme e no açúcar
