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terça-feira, 20 de março de 2012

Sair do aconchego


Há decisões difíceis que envolvem despedidas, saudade, mudança, afetos, medo, tristeza, aperto no coração, coragem, autonomia, abdicação, sofrimento, crescimento e muita firmeza. Se queremos nos afirmar em algo, precisamos ser firmes e seguir em frente, mesmo que deixemos um espaço vazio e inconsoláveis, os nossos cuidadores. É uma ausência necessária que não rompe com o que é sólido e indissolúvel. O importante é saber que quando regressarmos, nada mudou e aqueles que sempre nos amaram continuarão a amar-nos da mesma forma incondicional. Esse deverá ser o consolo de quem parte, para além da convicção de que é realmente disto que precisa para a sua progressão. Porém, tudo tem o seu tempo de habituação, ainda para mais quando se trata de um salto no escuro.
Somos pressionados a ser audazes, corajosos, destemidos num mundo sem perspectivas. Quando a sorte deixou de ser o amuleto dos incapazes e despreparados, vêmo-nos obrigados a reagir na inconstância.
O maior bloqueio são os sentimentos, que não conseguimos engavetar e aplicar, unicamente, quando nos convém. Eles manifestam-se sem serem solicitados, são mestres em inconveniência e tentam atrasar nosso caminho. Pesam ainda mais na hora da despedida e fazem-nos duvidar das nossas vontades. Se por um lado sabe bem estar sob a guarda de quem nos protege, por outro sabemos que essa proteção limita a nossa liberdade e retrai o nosso crescimento. Sofremos todos e nunca esquecemos o quanto doeu abandonar o lugar onde sempre nos sentimos bem e acolhidos, e os olhos suplicantes de quem deixamos para trás. Mesmo que saibamos que podemos voltar, ficamos com a consciência de que quando regressarmos as sensações serão outras, apesar de valorizarmos ainda mais o regresso ao aconchego. Nós entretanto mudamos. O nosso olhar mudou. Amadurecemos porque assim teve de ser mas nunca esquecemos do quão difícil foi essa transição e quanto ganhamos com isso.
  

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Sniper


Um quarto vazio, apenas um telefone ligado à ficha, acompanhado por uma lista telefónica, uma janela de postigo gradeada, um cheiro fétido a humidade entranhada, um relógio de parede a marcar o peso do silêncio, um homem curvado, esconde a cara entre os joelhos e luta com pensamentos ruins. Tudo à volta é triste e desolador. Parece que a esperança morreu ali.
O telefone toca e quebra o silêncio profundo, despertando a mudez do homem, que sem esforço, num único movimento, alcança o auscultador e num tom de voz impessoal, responde ao seu interlocutor, que lhe confia uma ordem de comando. Obediente e decidido, abandona o buraco húmido e sebento, para cumprir mais uma missão que o graduará na especialidade do Mal, que contamina o Mundo.
Convenceram-no de que era má pessoa, só porque tropeçara nalguns erros de percurso e, por isso, fora programado a cometer atrocidades, para gáudio dos seus educadores. Alfabetizaram-no para o mal, deram-lhe um rumo, traçaram-lhe um destino, atribuíram-lhe uma Vida, integraram-no e ele só tem que ser grato e obedecer sem questionar. Ensinaram-no a crescer na escuridão e a defender-se às cegas. O medo, com o qual conviveu so many times in so many ways, preparou-o para agir com frieza e muito método, aperfeiçoando a sua técnica de assassino profissional. A sua experiência leva-o a inspirar-se no medo e atingir os seus objectivos com muita determinação, sem se desviar do seu compromisso para com os seus orientadores. Nas suas missões, não há lugar a empolgações, nem excessos de vedetismo, que comprometam a perfeição do acto em si e venham a abrir fendas, por onde se esgueiram as vontades próprias, de quem não se soube controlar e arriscando catastrofizar o momento.
Não há desvios, não há hesitações, não há recuos, não há remorso, não há adiamentos, não há precipitações, não há desperdícios, não há erro.
Este homem verga-se à perfeição e trabalha-a compulsivamente. Dentro da sua desconstrução mental, a busca da perfeição é o único traço de normalidade que nele podemos vislumbrar. Tudo o resto são distúrbios.
Age isoladamente. A companhia só o faz distrair-se das suas prioridades. A sua maior defesa é não manifestar-se em absoluto sobre coisa alguma e assim passar despercebido. A sua capacidade de parecer invisível arrecadou-lhe bons serviços e a confiança da sua clientela fiél.
Apesar de ainda não ter perdido a habilidade e perícia de sniper, teme ser vítima da perda de defesas, consequência do avanço da idade. Não se encara num lar para idosos, a limpar a sua carabina, que tantas baixas provocou. Nem se encara a socializar com os velhinhos incontinentes de pantufas e roupão.
Se calhar quando essa fase chegar, regressa ao buraco húmido e ordena ele próprio a sua morte.  

Acordei o mundo

Najla tinha muita dificuldade em dormir. No seu entender, a vida podia acabar se se deixasse adormecer. Uma convicção implantada, desde a m...