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sexta-feira, 6 de maio de 2011

Amor não correspondido


Almoço de Família às treze horas, sem atrasos. Assim manda a etiqueta. Sara, nada dada a imposições, mais uma vez, falha na pontualidade e deixa todos suspensos aguardando sua chegada. Seus atrasos não são premeditados, seu ritmo é que não sofre nenhum beliscão mesmo sabendo que o tempo não espera. Apressar-se é palavra não grata e faz transpirar, além de acrescentar excesso de responsabilidade e preocupação. Sara não abdica das suas rotinas, só para chegar a tempo a qualquer evento. Todas elas têm que ser cumpridas, nem que para isso chegue atrasada e tenha que se justificar com o injustificável. Sua Família resignou-se a esse seu mau hábito e já encara com humor a sua descarada falta de pontualidade. Meia hora depois, com todos à mesa confraternizando, chega Sara, no seu porte elegante, imperturbável e sorridente, saudando de longe os presentes, desatentos à sua provocação. Sobrou um lugar junto de Abel. Ambos da mesma idade e muito próximos.
Abel nunca deixou de guardar-lhe assento junto a si, garantindo assim um serão bem animado, repleto de novidades. E de facto assim era. Sara nunca o deixava pendurado em vão. Compensava-o com suas histórias que a todos pareciam cansar, menos a Abel, que se deleitava a acompanhar todos os pormenores da devassa. Sara aproveitava-se da rendição do seu primo, pelo seu estilo de vida, para se orgulhar das suas vaidades, sem receio de comprometer a sua privacidade. Adorava expor-se e chocar as elites, tão ocupadas com suas inúmeras reservas em Ser desabridamente. Nem seus pais e irmãos a reconheciam. Eles tão obedientes e rendidos a pressupostos estabelecidos. Apesar de não ser adoptada, sempre destoou do resto da ninhada, que procura a protecção familiar e evita afrontar seus antepassados. Sara é mestre em contrariar, provocar, quebrar regras, destacar-se e desviar atenções, incomodando tudo e todos. Felizmente há quem goste. Abel gosta e muito, nem Sara sabe quanto. Até a sua falta de educação, quando intervala o diálogo para mascar de boca aberta, deixando um cheiro intenso a mentol no ar, não faz esmorecer o seu grande afecto por Sara. Ele conhece-a melhor do que ninguém e sabe que ela é muito mais que aquilo que aparenta. Afinal o Amor é assim mesmo. Vê coisas que mais ninguém vê.
Abel, sem saber, tinha sido atingido por esse torpedo de emoções que só o Amor provoca. Toda a família suspeitava que havia entre eles algo mais que uma grande amizade mas nunca quiseram aprofundar o que se assume contra natura. Abel não sabia identificar seus sentimentos mas reconhecia que na sua presença, sentia-se soberbo. A Tia Custódia, sua mãe, assistia de longe aquela imensa cumplicidade, temendo vir a tornar-se uma desilusão para o seu menino. Sara não era Mulher para Abel. Campeã em provocar desgostos. Certamente, não deixaria de alastrá-lo a Abel que insistia em persegui-la para todo lado. Ela acabaria por se cansar dele e partir sem aviso. Aliás sempre demonstrou não se identificar com o meio onde cresceu, lado a lado com Abel, seu eterno seguidor.
Abel parecia não se importar em sofrer nas mãos de Sara. Ele só não a queria perder de vista, tamanha era a sua obssessão. A intensidade dos seus sentimentos foi aumentando e assustando Sara, que se via encurralada entre a vontade de estar com seu melhor Amigo e o remorso de estar a suscitar algo que não se vai realizar, porque não é do seu desejo. Como se desactiva esta fixação em alguém, sem comprometer a amizade? Sara vive esse dilema. Culpa-se, agora, por ter abusado de Abel só porque lhe aprazia sentir-se amada. Abel reunia aquilo do qual ela mais carecia, compreensão e carinho. A seu lado, conseguia alhear-se do mau ambiente familiar, composto por pais autistas e demasiado agarrados a valores morais que reprimem as diferenças. Sem entender, a rejeição dos seus pais e irmãos, ao seu modo de ser, procura junto de familiares apurar a sua verdadeira origem e poder justificar o porquê de ser alvo de repúdio. Mesmo após saber não existir mistério algum, envolvendo o seu nascimento, que atribua aos seus pais a condição de pais de acolhimento, não se convence e decide demorar-se numa inspecção minuciosa ao espelho, para aferir as suas semelhanças físicas. Até nisso não restavam dúvidas. O nariz sardento, herdou da mãe e as covas, junto aos lábios, foram oferta do seu pai, bem como, a tez morena que a descendência distante Goeza lhe confere. Não há erro. Sara é uma Moreira de Andrade dos pés à cabeça. Moreira por parte da Mãe e Andrade por parte do Pai. Se o espelho não engana, os registos de perfilhação também não, porque é que não existe uma boa base de entendimento entre Sara e seus pais? Uma pergunta à qual Sara não encontra resposta e se cansou de aprofundar. Abel ajudou-a a superar o trauma do patinho feio, que a ninguém pertence nem a lugar nenhum. Como poderia ela viver sem Abel. Seu anjo da guarda, que ela ocupou durante tanto tempo, abusando repetidas vezes da sua dedicação. A pedido de sua Tia Custódia, Sara decidiu que era melhor libertá-lo para que ele pudesse ser Feliz, ainda que ambos venham a sofrer com esse afastamento. Na sua Vida tem sido uma constante, as solicitações para sair de cena e não contaminar o ambiente que se quer feliz e caseiro. Sem ninguém saber, sumiu para parte incerta mas antes deixou uma carta explicando as suas razões embrulhadas em muita mágoa e tristeza. Quem não entendeu esta atitude foi Abel que ainda alimentava a oportunidade de com ela gerar muitos patinhos feios, iguaizinhos a Sara e sua exuberante forma de ser. Bem hajas Sara.
  

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Najla tinha muita dificuldade em dormir. No seu entender, a vida podia acabar se se deixasse adormecer. Uma convicção implantada, desde a m...