quarta-feira, 15 de agosto de 2012

"Faixa de Gaja"


Se eu não fosse Mulher, seria certamente um Homem perdido na sua identidade sexual. Nasci para Ser Mulher e ajo como tal e às vezes devo confessar que me aterroriza um pouco, esses meus ímpetos femininos, que não disfarçam quem sou. Há característcas nas Mulheres que não gosto mas que eu própria reencarno e isso deixa-me mais assustada ainda. Vaidade é uma delas. Sim gosto de sobressair através dos meus trapos, que batalham por um espaço digno no meu depósito de fantasias de Mulher saliente. Bem sei que não são eles que me dão a consistência de que preciso, mas ajudam a elevar a minha auto-estima feminina. Adoro uma perna alongada por um salto alto, que termina num queixo içado de confiança e num sorriso rejubilante. Para mim cara lavada significa blush, eye-liner, sombra nos olhos e um batôn que aumente o volume dos meus lábios. Sem esses pós e brilhos sinto-me um pão sem sal. Decotes profundos já não são do meu agrado nem "faixas de gaja" (mini-saias ou vestidos reduzidos). Já os experimentei mas o incómodo é grande e, aliás,  nunca achei que me assentassem. Minhas medidas são, digamos, demasiado pronunciadas e anti tecidos demasiado aderentes.
Desabafar tudo aquilo que inunda a minha alma é provavelmente a característica que melhor evidencia a minha génese feminina. Não somos boas a medir as consequências dos nossos desabafos. Eles são mais repentinos e tão oportunos quanto arrotos sonoros.
Outra característica que não seduz e que eu partilho com tantas outras Mulheres é ter a capacidade de mudar o ambiente de bom para mau em instantes. Nosso humor é mais frágil que uma pétala de rosa. Absorve tudo o que o rodeia e atribui-lhe enorme significado. Nada nos é indiferente.
Não sei simplificar nem relativizar.
Mais estranho ainda é darmos importância a pressentimentos que aparecem sem fundamento. Quando eles surgem, activamos nossos alertas e desconfiamos do que é garantido.
Imprevisíveis sempre. 
Incrível é quando convencemos os outros da nossa insegurança na tomada de decisões, que nós já idealizamos na nossa cabeça e tudo iremos fazer para as concretizar, apesar de divertirmo-nos a ouvir terceiras opiniões.
O universo masculino desespera por nos entender e é esse enigma que adoramos criar e que nos torna ainda mais irresistíveis.
   

domingo, 12 de agosto de 2012

Um "Abre Olhos"



Querida Amiga Verdadeira. Amiga de longos Invernos e Verões apressados, que deixam saudades. A Ti, dedico estas minhas palavras, que creio ajudarem a quebrar a distância física que impede de estarmos juntas tantas vezes quantas aquelas que achamos que merecemos. Tenho tanto para te contar, mas não sei por onde começar. Se adotar o critério da prioridade, então minha tarefa fica difícil de ser superada, pois todos esses acontecimentos exercem influência na minha Vida e cada um assume uma importância particular. Desde que me abandonaste para cuidar da tua Felicidade, algo que eu entendi perfeitamente apesar de me entregares à solidão, acabou por se tornar num factor sorte. Se bem que a tua presença alegraria ainda mais os meus dias e fomentaria ainda mais a minha Felicidade. Não sei se estás preparada para assimilar tudo aquilo que tenho para te revelar, por isso recomendo que reserves a leitura desta minha carta para uma altura de maior disponibilidade, pois vais precisar de dispôr de todos os teus sentidos. Lembras-te da promessa que eu tinha feito quando me despedi de ti à três anos atrás, lavada em lágrimas de despedida? Lembras pois. Ainda outro dia mencionaste-o e eu, propositadamente, desviei o assunto apesar de, naquele momento, ter algo para desenvolver sobre isso. Só que preferi arrastar por mais algum tempo as novidades. Até me admirou não insistires. Se calhar se tivesses insistido eu teria desbobinado tudo e arrematado o assunto. Não sou Mulher de curtas metragens. Sempre gostei de prolongar um pouco mais. Os resumos tiram toda a criatividade e graça aos episódios. Marca bem este dia na tua agenda pois será um dia memorável para ambas. Finalmente vou desabafar o que tenho entalado e tu vais usufruir dessa revelação e partilhar dos mesmos sentimentos. Dá-me só tempo de servir-me de um copo de martini rosso, para aguentar toda a intensidade do momento. És servida? Não gosto de pecar sozinha. Serve-te à vontade.
Foi tudo muito repentino, mágico e revelador. Uma Nova Realidade se impôs. Aliás, não se tratou de uma nova realidade mas da mesma Realidade, só que vista de outro ângulo.  Descobri que era Feliz e não sabia. Finalmente saí do coma paralisante que me retirou a lucidez e descobri que tinha conquistado a Felicidade. Só precisava dar-lhe maior apreço. Algo me tinha impedido de ver a Realidade diante de mim. Quando fiz a promessa de ser feliz desconhecia que já o era. Pelos vistos, também tu querida Amiga já o sabias só eu é que vivia na ignorância. Estupidamente insistia em ver a Minha Vida através das lentes daqueles que só sabem desdenhar e apontar. Um beliscão me fez acordar e colar todos os retalhos da minha Vida num grandioso smile que eu decidi partilhar contigo Minha Grande e Eterna Amiga, que nunca desistiu da Nossa Amizade.
Eu que pensava ter pouco do que me orgulhar, por não ter uma Vida exuberante em sucessos que me distinguissem dos demais. O que nos deve verdadeiramente distinguir são as nossas atitudes, o nosso coração, a nossa bondade, a nossa sensibilidade, os nossos valores, as pessoas que conquistamos, aquilo que transmitimos e tudo aquilo que geramos. É Disso que nos devemos orgulhar. O resto são meros acessórios que só nos sabem distrair do mais importante.


segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Não é a Minha Vez


Duas pessoas largadas numa sala impessoal, sem cor, fria e metálica. Uma secretária ocupada por um ser sem alma e sem ambição, treinado a obedecer sem questionar. Um telefone que estremecia sem parar e uma voz fanhosa a conduzir um diálogo programado com perguntas e respostas. Numa mesa de verga jaziam revistas da devassa alheia, com toda a variedade de escândalos da actualidade. A demora fez-me preferir o meu livro de bolso do momento "O que me trouxe aqui?". Uma questão que ecoava na minha cabeça sem cessar e tão pertinente naquele momento. Afinal o que estava eu ali a fazer. Assim que entrei naquela sala comecei a hiperventilar e a minha ansiedade dominou-me por completo. Nas mãos agarrava a minha sorte ou falta dela. Aquele tempo de espera podia estar a ser desperdiçado, caso não esteja em maré de sorte. Diante do carrasco vivo de cabelo loiro platinado que não poupava na pastilha elástica, barricados naquele buraco sem janelas e pejado de fendas, tantas quantas as vidas que por ali passaram e não vingaram, aguardavamos estóicamente a nossa vez.
Finalmente, a vasta grinalda dourada se lembrou de mim e me acompanhou até ele, o porta-voz das boas e más notícias. Diante de mim um Homem corpulento, impassível, frio, distante, de voz abafada pelo excesso de maus vícios, que descobri ter família, filhos e netos, pela coleção de retratos que formavam uma pequena exposição de parede. Então pensei que talvez aquele homem pudesse ter sentimentos e não ser tão bruto assim. Quando o panorama não se apresenta auspicioso, tendemos a agarrar-nos a ínfimos pormenores que nos devolvam esperança.
Eu e a minha boa educação, que parece não desarmar a todos, entramos em campo, prontas para tudo. Preferi ficar de pé apesar da insistência para que me sentasse. Afinal a resposta a todas as minhas dúvidas demoraria segundos e eu não podia perder mais tempo. Vestido de bata branca e armado em Mestre do Suspense, Venceslau Bogas, de seu nome, desferiu suas palavras à queima roupa e nem se preocupou em saber se tinha trazido meu colete à prova de duros golpes. Atordoada digeri tudo no momento, suspirei de alívio, agradeci e fugi dali para nunca mais voltar. Aquele nao era o meu habitat. Precisava desembaraçar-me daquele cheiro bafiento e voltar a cultivar a minha vontade de viver, até ali sustenida por exames e mais exames de despistagem, como se eu fosse uma cobaia em missão.
Resisti e sinto-me mais forte que nunca pela oportunidade que me foi dada e por saber que não chegou a Minha Vez. Não era suposto. Quando chegar a minha vez prefiro que ma anunciem ao som das quatro estações de Vivaldi na máxima potência e eu esteja confortavelmente deitada num cadeirão de pele, voltada para uma barreira de vidro que reflecte bonitas paisagens com cheiro de mar.  

Acordei o mundo

Najla tinha muita dificuldade em dormir. No seu entender, a vida podia acabar se se deixasse adormecer. Uma convicção implantada, desde a m...