A Luz apagou-se, o coração acusou batimentos cardíacos cada vez mais fracos e acabou por decretar falência, os sentidos desligaram-se. O sangue deixou de se espalhar e bombear as artérias, o corpo arrefeceu e rapidamente virou alimento de larvas, que atraídas pelo seu intenso odor, formaram uma gigantesca legião desordenada e faminta.
Sua alma levitou como uma sonda no espaço e sem deixar rasto partiu, deixando apenas a consolação de ter partido em paz.
Inconsoláveis, estavam as figuras vestidas de negro, que sem desgrudar, velavam o corpo, empregando ainda mais profundidade ao momento fúnebre. Quanto mais consumidos pela tristeza melhor. Mais tarde serão recordados como os mais afectados com a perda, que o tempo se encarregará de esbater.
Frases consoladoras saídas de um qualquer manual de boas maneiras rebentam com a nossa dor, porque teimam em querer apagá-la.
É uma batalha perdida e inútil. Para quê remediar o irremediável, com palavras de apoio que só sabem interromper nossa necessidade de privacidade. Nada disso nos alivia, nem é nosso propósito aliviarmo-nos. Afinal a dor é a única demonstração de Amor que nos resta e, por isso, não procuramos conforto nessa onda repetitiva de condolências gentis.
Não nos queremos despedir. Não queremos atirar para o passado o que previmos ter no futuro. Não nos queremos libertar da dor, ela prende-nos áquilo que recusamos abandonar apesar de nos ter sido retirado. O facto é que sabemos que a partida daqueles que mais amamos e veneramos, não impede o nosso percurso de Vida e essa evidência deprime-nos ainda mais. O pior é que ultrapassá-lo não resultará fácil enquanto as recordações recentes não se desvanecerem mas, com a passagem do tempo não restarão mais motivos para reviver o que não se pode recuperar e tudo aquilo que foi importante se evaporará.
Queremos impedir a passagem do tempo e comandar o nosso pensamento para aquele ou aqueles momentos em que fomos tão felizes e cúmplices. Queremos continuar a ser dignos do Amor dos ausentes e ficar suspensos por um sinal da sua omnipresença, que ditará a continuidade do nosso amanhã numa busca incessante por algo que nos aproxime deles.
Algo mudou e é essa impermanência que nos assusta. Aquilo que não podemos controlar coloca-nos numa posição muito vulnerável, sacrificando a nossa resistência à dor.
O sofrimento não honra os ausentes nem os faz ressuscitar. Viver Felizes é o melhor tributo que lhes podemos prestar porque foi assim que eles nos fizeram sentir e continuariam a fazer sentir. É nossa missão retomar esse ciclo de felicidade.
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