Duas pessoas largadas numa sala impessoal, sem cor, fria e metálica. Uma secretária ocupada por um ser sem alma e sem ambição, treinado a obedecer sem questionar. Um telefone que estremecia sem parar e uma voz fanhosa a conduzir um diálogo programado com perguntas e respostas. Numa mesa de verga jaziam revistas da devassa alheia, com toda a variedade de escândalos da actualidade. A demora fez-me preferir o meu livro de bolso do momento "O que me trouxe aqui?". Uma questão que ecoava na minha cabeça sem cessar e tão pertinente naquele momento. Afinal o que estava eu ali a fazer. Assim que entrei naquela sala comecei a hiperventilar e a minha ansiedade dominou-me por completo. Nas mãos agarrava a minha sorte ou falta dela. Aquele tempo de espera podia estar a ser desperdiçado, caso não esteja em maré de sorte. Diante do carrasco vivo de cabelo loiro platinado que não poupava na pastilha elástica, barricados naquele buraco sem janelas e pejado de fendas, tantas quantas as vidas que por ali passaram e não vingaram, aguardavamos estóicamente a nossa vez.
Finalmente, a vasta grinalda dourada se lembrou de mim e me acompanhou até ele, o porta-voz das boas e más notícias. Diante de mim um Homem corpulento, impassível, frio, distante, de voz abafada pelo excesso de maus vícios, que descobri ter família, filhos e netos, pela coleção de retratos que formavam uma pequena exposição de parede. Então pensei que talvez aquele homem pudesse ter sentimentos e não ser tão bruto assim. Quando o panorama não se apresenta auspicioso, tendemos a agarrar-nos a ínfimos pormenores que nos devolvam esperança.
Eu e a minha boa educação, que parece não desarmar a todos, entramos em campo, prontas para tudo. Preferi ficar de pé apesar da insistência para que me sentasse. Afinal a resposta a todas as minhas dúvidas demoraria segundos e eu não podia perder mais tempo. Vestido de bata branca e armado em Mestre do Suspense, Venceslau Bogas, de seu nome, desferiu suas palavras à queima roupa e nem se preocupou em saber se tinha trazido meu colete à prova de duros golpes. Atordoada digeri tudo no momento, suspirei de alívio, agradeci e fugi dali para nunca mais voltar. Aquele nao era o meu habitat. Precisava desembaraçar-me daquele cheiro bafiento e voltar a cultivar a minha vontade de viver, até ali sustenida por exames e mais exames de despistagem, como se eu fosse uma cobaia em missão.
Resisti e sinto-me mais forte que nunca pela oportunidade que me foi dada e por saber que não chegou a Minha Vez. Não era suposto. Quando chegar a minha vez prefiro que ma anunciem ao som das quatro estações de Vivaldi na máxima potência e eu esteja confortavelmente deitada num cadeirão de pele, voltada para uma barreira de vidro que reflecte bonitas paisagens com cheiro de mar.









