segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Querido Mês de Agosto



O Mês de Agosto é pior que uma virose infecto-contagiosa. Seu efeito é mais avassalador que uma virose. Agosto é sinónimo de enchentes, excessos, falta de civismo, ruído, música alta, gritaria, afundanços na piscina como se esta fosse exclusividade só de alguns, turistas com ar perdido e cansados de procurar por ajuda de gente capaz, preços inflacionados na restauração, filas para o pão, filas para os gelados, filas de trânsito, filas à entrada das discotecas de elite, filas de espera para comer, taxistas gananciosos que aos poucos vão matando o turismo na região com a sua esperteza saloia, excursões, romarias, muito fogo de artifício com altos patrocínios, angariados pela comissão de festa da terrinha, filas de automóveis que se estendem ao longo da via, aguardando estoicamente por estacionamento no melhor spot, operações stop ao virar da esquina, casamentos sem parcimónia, cheiro intenso a creme protector solar, crianças em euforia gozando de uma liberdade sem freios, desrespeito pelos sinais de trânsito, que ganham a qualidade de placas decorativas em tons de perigo e prevenção, cães incontinentes e donos despreocupados, filas nas caixas dos hipermercados, filas para levantar dinheiro, fila para abastecer nas bombas de gasolina, lixo acumulado, mau serviço, cheiro a churrasco, a indústria paraliza e o comércio ganha expressão com o chamariz dos saldos de fim de estação, incêndios com e sem mão criminosa, aceleras, buzinadelas cheias de carga nas mãos de manipuladores imbecis que carecem de atenção, francês com sotaque português, chicos espertos, ânimos exaltados, ataques de bola arremessadas por pés de pato,  pressa muita pressa, larápios à espreita, mirones, voyeurs ou, simplesmente, pasmões assumidos, garotas a querer parecer mulheres e mulheres a querer parecer garotas, para deleite dos engatatões, início de mais uma temporada de futebol com destaque para as novas aquisições e tema para dominar uma época, não fosse ele o desbloqueador de conversa preferido  dos machos militantes, aspersores de rega descontrolados, motards e seus malditos rateres. É a chegada do silly month. 
O Mês de Agosto faz-me lembrar os domingos de chuva no centro comercial. Só “pobo” aos magotes a ocupar todos os espaços, até os mais apertados, até caber. Socorrooooooooooooooo!
Loucura loucura para aqueles que gostam de viver no inferno e para esquecer, para aqueles que procuram sossego e oportunidade para apreciar sem ficar chocados.
Tudo choca no Mês de Agosto. É um mês que cultiva o mau gosto, a má educação, más atitudes, más posturas, más companhias, mau funcionamento, mau atendimento, que incita ao desgoverno, um mês onde o cumprimento de regras se torna a excepção e não prática corrente, basicamente, um mês sem limites.
Por tudo isto, o Mês de Agosto só é Querido por alguns.
Curioso é perceber que se fragmentarmos a palavra Agosto podemos convertê-la em A gosto, ou seja, o Agosto é assim mesmo, ao gosto dos seus seguidores que o tornam só seu e de mais ninguém, sem cerimónias e quanto mais piroso melhor.  

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Final Feliz

"Quando se ama alguém, tem-se sempre tempo para essa pessoa. E se ela não vem ter conosco, nós esperamos. O verbo esperar torna-se tão imperativo como o verbo respirar. A vida transforma-se numa estação de comboios e o vento anuncia-nos a chegada antes do alcance do olhar. O amor na espera ensina-nos a ver o futuro, a desejá-lo, a organizar tudo para que ele seja possível. É mais fácil esperar do que desistir. É mais fácil desejar do que esquecer. É mais fácil sonhar do que perder. E para quem vive a sonhar, é muito mais fácil viver."

in Diário da tua Ausência
Margarida Rebelo Pinto


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Não estavamos preparados mas sabíamos que ia acontecer. Mesmo assim arriscamos. Assumimos sem pensar naquilo em que nossas Vidas se iriam transformar. Muitas emoções se atropelaram, tantas que algumas ainda estão por descodificar e por pouco não arrasaram connosco. Volto a dizer, não estávamos preparados para abdicar de nós, das nossas vontades, dos nossos ócios e de alguns prazeres também. Apesar de continuarmos a dizer que trouxe felicidade, certo é que também abalou com alguns alicerces pouco sólidos e que ameaçaram ruir caso não tomássemos uma atitude.
Se calhar nós é que não havíamos dado conta que estávamos distantes, na forma de estar, de pensar, de reagir, de exprimir, de encarar a realidade. Muito provavelmente, andávamos distraídos no computador, no trabalho, na leitura, na selecção dos programas de tv, nas saídas a dois no meio da multidão, nos nossos hobbies e de repente temos que colaborar em equipa e criar consensos. Afinal, viemos a descobrir que também há algo que nos desune e em que nos revelamos antagónicos.
Cada um quis impôr suas razões e nenhum estava disposto a aceitar a razão contrária porque afinal estavamos ambos a colaborar para o mesmo e a dar o nosso melhor e nada mais ofensivo do que nosso parceiro para a Vida nos venha apontar erros ou más condutas, quando apesar de todas as contrariedades continuamos ali, presentes, activos, resistentes e a dar tudo de nós.
Quando damos por nós estavamos a discutir miudezas e a esgotar as energias remanescentes, que deveriam ser empregues em algo que ajudasse à regeneração física e psicológica.
Já nem havia tempo para lamber as feridas. Só havia tempo para repetir tarefas e descansar nos intervalos. Qualquer incómodo era encarado com a nossa máxima intolerância, a qual se encarregava de azedar o ambiente e contribuir para silêncios profundos, mágoas, distanciamento emocional, desilusão e uma sensação de perda iminente.
Estavamos demasiado cansados para procurar outras formas de reacção com efeitos apaziguadores. Limitavamo-nos a aliviar o nosso desespero com troca de palavras, mais letais que disparos de bala.
 Fomos obrigados a isolar-nos e cada um fazer a sua própria introspecção e tentar perceber se queríamos continuar a lutar ou desistir a meio. Se valia a pena aceitar nossas diferenças e não deixar que elas pesassem na nossa relação, dando continuidade à nossa história ou então encurtá-la e transformá-la num resumo dos melhores momentos e cada um seguir seu caminho, sem descurar nosso bem mais precioso.
Apesar de alguns saldos negativos, ainda ficamos com algum fundo de maneio para tentar mais uma vez recuperar a felicidade que existia quando estávamos juntos.  

domingo, 4 de agosto de 2013

Boas Surpresas


 
Acordei ao som de gargalhadas estridentes, que ecoavam em toda a casa e fizeram estremecer o meu gato persa “centelha”, que aborrecido se esgueirou para o jardim.
Na verdade, aquelas risadas eram me familiares mas, o despertar retumbante atordoou de tal forma o meu pensamento, que este demorou a reestabelecer-se. Precisei de alguns minutos para descobrir o culpado, por aniquilar a tranquilidade do meu sono, mas até que não foi difícil achá-lo. Só podia ser o Vicente e sua espaçosa e generosa forma de ser, que a todos conquista e eu, então, que o diga. Fui impiedosamente arrebatada pela sua envolvência magnetizante. Até hoje, ainda não parou de me surpreender com suas atitudes inesperadas de uma sensibilidade invulgar.
Aliás, nosso primeiro encontro foi no mínimo caricato, porém inesquecível. Estava eu a recuperar de uma cirurgia à tiróide, ainda sob observações médicas e sem data prevista para abandonar a enfermaria, quando sou abordada por um fulano de olhar castiço, em roupão e chinelos a condizer e, sem sinais visíveis de enfermidade. Nem parecia pertencer aquele local.
Da forma como estava vestido associei que, tal como eu, deveria ser inquilino temporário do hospital. Porém, seu contentamento despropositado, levou-me a suspeitar que tivesse fugido da ala psiquiátrica e aterrado na normalidade dos meus aposentos. São inúmeros os quartos de um hospital, mas sem qualquer razão aparente que o justificasse, foi justamente aterrar no meu e atormentar meu sossego. Logo eu, que prezo tanto a minha sanidade mental e evito conviver com a loucura dos outros para não vir a ser contagiada e perder o meu equilíbrio. Tentei não mostrar-me intimidada com sua presença e procurei reagir com normalidade mas, sem prolongar muito o diálogo, para não fomentar nenhum tipo de empatia. Esse era o meu objectivo. Eu digo era, porque se revelou totalmente o contrário.
Não tardou a apresentar-se e tentar ganhar proximidade. Iniciei automaticamente um processo de desconfiança e, para me defender de um possível ataque tresloucado, agarrei o botão de emergência e esperei que a ocasião surgisse. Seus modos educados, sua simpatia e amabilidade amorteceram o meu instinto de defesa, que deixou de estar alerta e fez soltar, sem esforço, o botão de socorro. Algo o tinha atraído aquele local e algo me atraiu nele e me fez acreditar que podia confiar. Certamente, a convalescença deixou-me mais carente e sôfrega de afectos.
Vicente, tal como eu estava hospitalizado e a recuperar bem, de uma operação na coluna. Anos e anos de más posturas, intensa actividade física, excessos de carga. Não que eu tivesse perguntado ou sequer presumido, esta foi a explicação, que ele mesmo, fez questão de revelar e que explicam o seu internamento. Se bem que não me admirou, quando apontou como uma das causas actividade física frequente e excessiva, a julgar pelo seu físico bem torneado, de fazer corar o seu antepassado Adónis. Se quisesse, já teria sacado o acesso à sua conta bancária, tal era a sua permeabilidade e vontade de se expor.
A julgar pelos dedos nus e sem marcas, não é comprometido mas quantas já não foram enganadas pelas aparências e conclusões precipitadas como esta. Prefiro continuar a guardar reservas.
Continuava sem saber o que o tinha atraído até ali e apesar de me achar uma pessoa frontal e sem rodeios, estranhamente, aguardava os próximos desenvolvimentos com expectância.
Finalmente, resolveu desvendar o mistério e acabar com o suspense.
A razão da sua intrusão deixou-me perplexa e ao mesmo tempo enternecida com a sensibilidade demonstrada.
O meu quarto, sem que eu me apercebesse, tinha vista para a praia e sua marginal iluminada, sempre movimentada por casais apaixonados, praticantes incansáveis de jogging, crianças endiabradas, astutos comerciantes, turistas incautos, entre outros. Vicente queria apenas sentir o palpitar da vida no exterior e assistir à mobilidade das pessoas no seu dia-a-dia. Sentia-se engaiolado e impedido de fazer o que mais gosta. Nunca tinha permanecido tanto tempo fechado e estava a detestar a sensação. Já não era muito do seu agrado, apesar de o fazer por consideração, visitar amigos e familiares hospitalizados. Sempre que era obrigado a isso, ausentava-se várias vezes com o pretexto do famigerado vício do tabaco.
Senti que as longas conversas que tivemos o acalmavam e o faziam esquecer desse lugar sinistro que é o hospital, sua mais recente morada temporária.
Foi nesse clima de cumplicidade que partilhamos a mesma janela e usufruímos demoradamente da companhia um do outro com a conivência do staff da enfermaria, que se rendeu à nossa vontade de estarmos juntos.
Naturalmente, criamos uma forte Amizade que se transformou numa crescente relação de Amor que tudo supera, até mesmo gargalhadas sonoras a consumir o meu sono e a fomentar a minha curiosidade. Apesar de tudo, deixei-me estar, sentia-me demasiado cansada para desperdiçar minhas energias com uma anedota ou piada qualquer, além disso, iria precisar de ter mais motivos para me rir de manhã, antes mesmo de encarar uma jornada de trabalho. Por isso, preferi questionar, no dia seguinte, a razão de todo aquele alvoroço nocturno.
Vim a saber que as explosões de riso foram provocadas pela seguinte mensagem, deixada pelo nosso filho Tiago de apenas sete anos:

“Pai e Mãe, a partir de hoje e para sempre, evitem beijos e recados prolongados à porta da escola. Eu sei que vocês me amam. Deixem-me crescer. Os beijos fazem-me encolher e os recados fazem-me chegar atrasado às aulas. Também vos Amo. Respeitem, por favor, meu pedido.
O Vosso Filho Tiago”.

Por fim, eramos dois pais comovidos por ter gerado um filho tão maravilhoso.
Valeu a pena ter esperado pelo dia seguinte e amanhecer com este dado novo. Nosso filho está a crescer e nós vamos ter que conviver com isso e resignarmo-nos às evidências.

Acordei o mundo

Najla tinha muita dificuldade em dormir. No seu entender, a vida podia acabar se se deixasse adormecer. Uma convicção implantada, desde a m...